sexta-feira, 19 de agosto de 2011

POR QUE HISTORIADORES?



Ivan Bilheiro – Graduando
em História e Filosofia

            Quando interpelado por uma pergunta, aparentemente simples mas de grande complexidade, apresentada por uma criança, sobre para que serviria a história, um dos principiadores do movimento dos Annales afirmou: eis o questionamento que chama o historiador a prestar contas.
            A exemplo da obra Apologia da história ou o ofício do historiador, de Marc Bloch, iniciada com este questionamento, toda uma biblioteca já se escreveu acerca do problema da legitimidade da História. Não é fácil a pergunta “O que é História?”, mas este é o desafio por excelência dos historiadores. Um questionamento inescapável.
            Uma forma um tanto quanto peculiar de abordar o problema é o de legitimar o ofício do historiador apontando aquilo com base no que ele se diferencia, aquilo que faz do historiador um profissional peculiar.
            Uma colocação bem interessante de Bloch foi a definição da História como a “ciência dos homens no tempo”. Explicitou aí os elementos fundamentais, as peças-chave do labor deste intrépido cientista, o historiador.
            Mas a amplitude da definição coloca, na frente do historiador, a pedra no caminho de Drummond. Um problema que poderia ser apontado por um questionamento infantil, como aquele feito a Bloch: se o historiador fala do homem (ou dos homens) no tempo, em que seu trabalho se diferencia do discurso comum, da conversa cotidiana? Chega a ser cômico, porém logicamente válido: uma fofoca sobre o relacionamento extraconjugal da vizinha, encerrado no ano passado, não deixa de ser um discurso sobre o homem no tempo. Deixando de lado o caricaturesco, a reflexão: jornalistas enveredam por pesquisas de cunho histórico, o discurso senso-comum afirma fatos do passado, em uma só palavra, o homem no tempo é elemento (matéria-prima) de várias formas de discurso. E então, a chamada para advogar a causa: por que, então, historiadores?
            Primeiramente, há que se fazer uma diferenciação crucial: o processo histórico, a dinâmica mesmo da vida, as ocorrências incontáveis e infindas do homem no tempo, isto é a história (note-se: h minúsculo). Já a História é aquilo com o que se ocupam os historiadores profissionais. Em síntese, então, a História debruça-se sobre a história.
Mas a pedra no caminho alerta para o entendimento do que segue: o interesse por este objeto, a história, é comum, é amplo, e é da natureza do próprio homem. Todos nos interessamos pelas ações, pelas ocorrências, pela vivência do homem, que se dá no tempo. Vale voltar a Bloch para ratificar sua percepção: os leitores de Alexandre Dumas, como ele diz, talvez sejam historiadores em potencial. E aí, trazendo à contemporaneidade, acrescenta-se: não o são, também, os leitores de Laurentino Gomes, por exemplo? E ele próprio, como tantos outros, não é?
A diferença fundamental entre o historiador profissional e o historiador diletante (o jornalista, o homem comum, etc) é a abordagem. O historiador tem método, e apresenta o método. Ele aborda o caos do homem no tempo, recortando-o, estabilizando-o, refletindo. Diante da realidade babélica da história, o Historiador não se acanha e, corajosamente, se imerge no trabalho na busca da compreensão. Neste sentido, uma fundamental diferença: o historiador tem (ou, ao menos, precisa ter) um vasto preparo teórico, porque é assim que a historiografia vai se diferenciar dos demais discursos que abordam a história.
O historiador é, portanto, aquele em que há a característica de todos os homens de querer compreender a si, mas que não se limita ao diletantismo e, indo além, estabelece métodos, formas de abordar “o homem no tempo”, de forma a se satisfazer com tal conhecimento (não se pode negar o prazer do fazer histórico) e a poder oferecer também este conhecimento à comunidade, aos outros. A História, através deste labor, está cumprindo seu papel, em meio às ciências, de auxiliar na compreensão da vida.
Concluindo, é possível dizer que os historiadores, então, estudam, investigam – de forma peculiar, metódica, com um preparo próprio e específico – aquele material pelo qual todos têm interesse: o “homem no tempo”, a história em si.
Concordo e complemento um amigo historiador que certa vez disse: os homens gostam da história ao mesmo tempo que a fazem. Os jornalistas a divulgam. Mas os historiadores... estes a mantêm de pé!

2 comentários:

  1. No Dia do Historiador, fica aí a reflexão...

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  2. Grande Ivan, excelente texto, mas, dele, segue-se uma pedrinha no caminho para brincarmos: existe História? Se sim, como ela é possível? Abraço.
    Dimitri

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